Espaço MEMÓRIA PIRACICABANA

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segunda-feira, 25 de setembro de 2017

O Congresso da UNE em Piracicaba

No início da década de 80, Piracicaba já começava a reagir mais fortemente contra o golpe militar implantado no Brasil desde 1964. A vinda do 32º Congresso da UNE (União Nacional dos Estudantes) em outubro de 1980, no campus Taquaral da UNIMEP, gerou repercussão internacional.


O reitor da UNIMEP na época, Elias Boaventura, foi um dos principais responsáveis pela iniciativa juntamente com o prefeito João Herrmann Neto, que gerou muito incentivo, mas também manifestações contrárias. Parte da Igreja Metodista era contra o apoio ao Congresso. Paralelamente, os católicos batiam palmas para a atitude. Além da coragem do patrocínio do evento, o ato ainda tinha um claro intuito de provocação e de desafio.
“Se pretendemos nos firmar como universidade alternativa e hoje já intranquilizamos a cidade, temos que caminhar para perturbar o Estado e incomodar o país”, afirmou Elias, que já lutava pela autonomia universitária da UNIMEP, em uma matéria do jornal O Diário, em setembro de 1980.

O reitor também chegou a ir até Brasília convidar o Ministro da Educação e o da Justiça para participar do evento, levando em conta que a UNE estava organizando nos dias 10, 11 e 12 de setembro, a Greve Geral dos Estudantes como um sinal de protesto para exigir do Governo Federal maiores recursos para o setor educacional no país. Na UNIMEP, os professores e alunos aderiram à greve, mas também discutiam uma paralisação interna devido a questões financeiras. Uma matéria publicada no mesmo mês, dizia que a ADUNIMEP não iria tolerar mais salários atrasados e se nada fosse regularizado, poderiam entrar em greve no mês de outubro, o que realmente ocorreu.

No dia 13 de setembro, um telefonema do CCC (Comando de Caça aos Comunistas) dizia que várias bombas seriam explodidas na Universidade durante o Congresso. Na manchete do jornal O Diário do dia seguinte, se lia em letras garrafais “Ameaças não impedirão realização do Congresso da UNE”, e na matéria, a declaração de Elias Boaventura: “Para mim isso é brincadeira de mau gosto (...) Agora, se for sério o telefonema, a minha resposta é essa: o congresso vai ser realizado. Sou homem de fé e vou substituir essa sigla, CCC para Cristo Comanda a Caminhada”.


O momento era de grande importância para a UNE, que ainda atuava na ilegalidade desde o início do regime militar, quando sua sede foi incendiada a mando do governo e muitos dos estudantes ligados ao movimento sofriam com perseguições, torturas e até execuções. O presidente da UNE, Rui César Costa Silva, agradeceu publicamente no jornal o apoio e acolhimento oferecido pela UNIMEP, Prefeitura e pelo povo piracicabano.

Foram quatro dias de evento, que apesar das ameaças foi um sucesso e reuniu cerca de seis mil estudantes de vários cantos do país. Na abertura do Congresso, estiveram presentes o ex-presidente Lula, que na época ainda era metalúrgico e estava lançando o PT (Partidos dos Trabalhadores), e figuras populares da música brasileira no “Show da UNE”: Gonzaguinha, Elba Ramalho, Sá e Guarabira, João Bosco, Ivan Lins. Uma programação cultural também foi organizada na cidade para ocorrer em locais abertos e fechados com entrada franca.

Para alojar os congressistas, foram cedidos locais pela Prefeitura, UNIMEP e Esalq, e a Comissão de Alojamento ainda criou a campanha “Adote um Estudante”, que graças à população piracicabana foi um sucesso, pois muitas famílias se dispuseram a ajudar. A alimentação era garantida por muitas merendeiras e pelo restaurante da UNIMEP, que preparavam 8 mil refeições diárias para os estudantes, que segundo eles eram de ótima qualidade.

No dia seguinte do fim do Congresso, o Jornal “O Diário” trazia diversas matérias sobre o evento e seu saldo positivo, que foi considerado por muitos até então “o melhor Congresso da UNE”. O reitor da UNIMEP, Elias Boaventura foi ovacionado pela audácia de apoiar este evento em um momento político tão crítico e sob críticas da própria Igreja Metodista.
“A UNIMEP não aceita fazer o papel de uma universidade castrada. Ela vai utilizar toda a sua rebeldia dentro do espaço que lhe é hoje assegurado”, disse Boaventura ao jornal “O Diário”.



Thaís Passos da Cruz, estudante do curso de Jornalismo da UNIMEP. Pesquisa realizada no acervo do jornal O Diário.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Foice, faca e espeto: agressão entre vizinhas

No ano de 1922 chegou ao juízo de direito da Comarca de Piracicaba a denúncia de agressão entre vizinhas, processo que hoje compõe o acervo fórum. Na tarde do dia quatro de setembro, por volta das 15 horas de uma segunda-feira, Sebastiana Maria José de 40 anos, solteira, tendo por profissão serviços domésticos sem instrução escolar, armada com uma foice de mão, golpeou a cabeça de sua vizinha Angela Victoria Dias. Segundo testemunhas, já era antiga a desavença entre as duas mulheres.

Angela teria ido até a casa de Sebastiana armada com um espeto e teria forçado a porta. Uma vizinha notou a movimentação e avisou Sebastiana que Angela havia tentado entrar em sua casa e chamam a polícia. Nesse mesmo dia, Angela derruba então um muro provisório entre sua casa e a de Sebastiana e, ao entrar no quintal, avança em sua vizinha ameaçando-a com uma faca. Para se defender, Sebastiana pega uma foice e acerta a cabeça de Angela, causando um ferimento de três centímetros na região temporal.

A promotoria pública de Piracicaba abriu uma denúncia contra Sebastiana Maria José em dezembro do mesmo ano. A sua defesa então pediu absolvição, a partir da lei vigente na época, “tendo em consideração também que Angela Victoria Dias é uma mulher dada ao vício da embriaguez e rixosa por instincta, ao passo que a denunciada é uma mulher bem-quista de todos os vizinhos, pelo seu bom comportamento e bons costumes”.

No dia 22 de Janeiro de 1923 o Juiz de Direito Rafael Marques Cantinho declarou encerrado o caso: “De acordo, portanto, com os fundamentos produzidos pela denunciada em defesa [...] pela absolvição de Sebastiana Maria José pelo dirimente do Art. 32§2° do código penal”.  



Maycon Costa, aluno do quarto semestre do curso de História UNIMEP.
Pesquisa realizada no acervo do Fórum.


segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Mudança de Gênero

No acervo Jair Toledo Veiga, se encontra um manuscrito sobre uma autorização do Juiz da 7ª Vara da Família de São Paulo, Henrique Calandra, a um homem de 33 anos, o qual não teve sua identidade revelada, para a troca de seu nome e sexo.
O documento nos revela que naquele momento o Brasil não realizava este tipo de cirurgia. O governo brasileiro só vai autorizar oficialmente a cirurgia no ano de 2008.
Impossibilitado de fazer a cirurgia no Brasil, se deslocou então para a Suíça. Importante ressaltar que o próprio documento traz uma informação de como era visto este procedimento no Brasil: “homens que extirparam o pênis e passaram a dispor de uma ‘cavidade’ no lugar”.
           


            O documento traz mais informações como a do Juiz, da Vara de Registros Públicos de Porto Alegre, Osvaldo Peruffo, que desde o ano de 1986 enfrentou vários processos semelhantes.
            É interessante sublinhar que ao final o documento descreve que quando havia esta mudança de sexo, na certidão de nascimento da pessoa deveria se constar que o “Sexo Atual” era consequência de uma cirurgia. E há uma pequena reportagem que na América do Sul, no ano de 1991, estes procedimentos eram realizados na Colômbia, mas só se realizavam com autorização oficial ou em caso de pessoas hermafroditas.
            Como o documento informa sobre mudança de sexo, é importante não deixar de mencionar que entre os anos de 1926 a 1931 foi registrado o primeiro caso de mudança de gênero no mundo. Foi o caso de Lily Elbe, que ocorreu na Dinamarca com o artista Einar Wegener que mudara de sexo e de nome. A cirurgia a qual ela passou, na época, era classificada como um experimento. Devido a várias etapas deste experimento Lily acabou por falecer quando foi implantado um útero, ela morreu antes de completar 50 anos. Seu caso foi retratado no filme de 2016 "A Garota Dinamarquesa". 


Fontes:
Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=vjq2FgjpXow - Trailer do filme A Garota Dinamarquesa


Ana Paula das Neves, estudante do 6º semestre do curso de História da UNIMEP.
Pesquisa realizada no Acervo Jair Toledo Veiga.


segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Carolina Maria de Jesus


Em uma matéria da revista Fatos & Fotos de 1966, Carolina de Jesus é entrevistada e questionada sobre o que aconteceu com a venda de seus livros. Ela tinha sido vista, naquele ano, catando papel e vivendo em extrema pobreza, mesmo depois de ter vendido milhões de livros (o aclamado “Quarto de Despejo”), que foi traduzido em 22 países e só no Brasil, até aquele momento, já tinha chegado a nove edições.


Carolina respondeu que editores alemães prometeram mais de Cr$ 6 milhões. Porém ficou esperando em vão e voltou a catar papel na rua por necessidade, pois não tinha dinheiro algum e precisava sustentar a família.



Com o pouco que ganho conseguiu comprar um pedaço de terra para plantar algumas coisas, mas mesmo assim passa necessidade. Segundo Carolina, “Aqui é o quarto de despejo. Pobre só pode oferecer a mão e a amizade.”



Vivian Monteiro, historiadora do Espaço Memória Piracicabana.
Pesquisa realizada no acervo Rocha Netto e João Chiarini.